Uso de Psicodrama nas sessões de Coaching

//Uso de Psicodrama nas sessões de Coaching

Uso de Psicodrama nas sessões de Coaching

Henrique foi um dos meus primeiros clientes de coaching por volta de 1999. Era um importante executivo de uma grande Seguradora. Sua principal queixa era que constantemente recebia feedbacks de seus gestores, colaboradores, pares e até de seus familiares, sobre seu comportamento distante e por vezes arrogante.

Henrique desejava melhorar seus relacionamentos, pois embora já ocupasse uma posição de executivo, estes comportamentos dificultariam, no futuro, o seu crescimento na organização e o distanciavam da equipe.
As pessoas se referiam a um comportamento específico de Henrique e que na maior parte das vezes não era percebido por ele.
Sabemos que as pessoas são muito mais do que um único comportamento. O problema de Henrique é que um destes comportamentos estava tão acentuado que os demais não eram percebidos pela equipe, pares e gestores.

O que era percebido no comportamento de Henrique era o uso excessivo do seu talento e que precisava ser ajustado. Henrique é um indivíduo determinado, tem foco em resultados e gosta de empreender. Comunica-se de forma objetiva e direta. Relaciona-se com as pessoas com distância e reserva. Gosta de fazer as coisas de forma independente, tem como referência a si mesmo, como gosta de competir está sempre comparando e entra nos desafios para vencer. Motiva-se por sucesso e realizações. As tarefas devem ser variadas e desafiadoras. Conclusão, Henrique tem comportamentos positivos se utilizados de forma adequada. O problema é que Henrique usava de forma exagerada e, portanto tornava-se extremamente exigente, arrogante, agressivo e dava pouca atenção à equipe de trabalho.

A maneira como nos comportamos projeta o nosso talento, a identidade, o estilo de fazer as coisas e as preferências cerebrais. Nas ações e atitudes está o modo de agir natural. Recebemos estímulos do meio em que vivemos o tempo todo, e o que nos diferencia uns dos outros é a maneira como respondemos a estes estímulos.

O talento é como nossa aptidão, quando utilizamos adequadamente, na medida certa, ele pode nos levar ao sucesso e quando usamos em exagero, tornar-se a nossa maior sombra. Por exemplo, um indivíduo que é comunicativo, persuasivo e sociável, poderá ter mais sucesso e será mais feliz, se trabalhar em áreas que utiliza a comunicação, a persuasão e lida com pessoas. Por outro lado, se este mesmo indivíduo falar demais pode esgotar os ouvidos de quem ouve e invadir a individualidade das pessoas, portando o talento deve ser usado na medida certa.

Orientado pela diretoria da seguradora, Henrique me procurou para algumas sessões de coaching. Em linhas gerais, nos limites desse artigo, Coaching é o processo de facilitação do desenvolvimento do indivíduo para que ele seja capaz de atingir e sustentar o seu estado desejado. Em outras palavras, é preciso conhecer-se para promover mudanças e sustentá-las.
Alguns elementos são essenciais neste processo, é uma metodologia focada na ação do indivíduo (o Coach é o facilitador do processo mas as mudanças devem ser realizadas pelo indivíduo periodicamente) baseada na PNL (programação Neurolinguistica) e em processos mentais, ou seja, reflexões acerca da nossa condição atual, futura e dos meios para realizá-las. Valoriza o Ser Humano e acredita que o indivíduo possui todas as respostas que busca. Estimula o uso da criatividade na solução de problemas e na tomada de decisões.

Uma das funções do Coach é fornecer ferramentas que facilitem o processo de alcance dos objetivos – o estado desejado -, idealizados pelo coachee. Há inúmeras ferramentas disponíveis. A primeira ferramenta que costumo utilizar nos processos de coaching, é o autoconhecimento e hoje existe uma grande diversidade de estudos acerca das preferências comportamentais, segue algumas teorias interessantes:

Os gregos diziam que o corpo humano sofria as influências dos quatro elementos naturais: Terra, Água, Fogo e Ar e que definiam os temperamentos ou humores dos indivíduos, o que nos tornariam diferentes.

Hipócrates, Médico, também Grego considerava a personalidade em sua forma de compreender o organismo humano, sistematizou estes temperamentos em Colérico, Sanguineo, Melancólico e Fleumático. Até este momento, acreditava-se que a partir do nosso temperamento, poderíamos desenvolver doenças diferentes e para tratarmos destas doenças, seria importante agir no temperamento.

Carl Gustav Jung, psiquiatra suíço, fundador da psicologia analítica, conhecida como psicologia junguiana, classificou os indivíduos pelas preferências comportamentais Sensitivo, Analítico, Intuitivo e Produtor.

William Moulton Marston, psicólogo americano, criador do polígrafo (detector de mentiras) criou um inventário onde pudesse medir a personalidade das pessoas comuns, através de quatro fatores, Dominância, Influência, Estabilidade e Conformidade.

Estes e outros estudos sobre o comportamento oferecem ao indivíduo informações sobre as principais características a cerca da personalidade, a maneira como se relaciona com o mundo, consigo próprio e com outras pessoas.

Henrique ao submeter-se a uma destas ferramentas, pôde identificar, inicialmente, seu talento e como estes comportamentos afetavam as suas relações familiares, afetivas e profissionais, descobriu o que o torna feliz e percebeu que se utilizasse estes comportamentos em equilíbrio poderia relacionar-se melhor com as pessoas e desenvolver-se profissionalmente.

Por várias vezes utilizei o psicodrama nas sessões de coaching, com o Henrique e com outros clientes, tendo como objetivo apresentar o comportamento, praticar os papéis profissionais e sociais ou desempenhar papéis nunca antes vividos. De forma sucinta, podemos dizer que:
[…] o Psicodrama é um método de intervenção e pesquisa nas relações interpessoais, nos grupos, ou de uma pessoa consigo mesma. Estimula a criatividade e mobiliza grupos para vivenciarem a realidade. Criado no início do século XX, pelo médico Jacob L. Moreno, tem sido usado na educação, em empresas, hospitais, clinicas e comunidades […] transcende da palavra para o ato, do diálogo para o jogo de papéis, da análise para a existência. […] o enredo que se encena é a história de vida, a experiência cotidiana da pessoa ou do grupo.
Para que Henrique pudesse desenvolver-se, decidi trabalhar com as etapas do desenvolvimento de papéis do psicodrama:

ROLE PLAYING ou atuar no papel: consiste em colocar o indivíduo em ação no papel específico que se quer trabalhar.
Role Playing, significa jogo, treinamento ou aprendizagem do papel, é o procedimento dramático que tem por objetivo a aprendizagem e estruturação. Pode ser utilizado em treinamentos profissionais ou para desenvolver qualquer novo papel social que se queira atuar (papel profissional: vendedor, secretária, gestor, enfermeira, médico, etc ou papel social: noivo ou noiva, esposa ou marido, mãe ou pai, filho ou filha).

ROLE CREATING ou atuar de forma criativa no papel, que consiste em desempenhar de forma espontânea o papel em um momento real.
Nesta etapa, após ter desenvolvido novas respostas ao meio, a partir do role playing, o indivíduo já possui um estoque de novos comportamentos que poderá utilizar e modificar a forma de agir em situações do cotidiano.
Apliquei essas etapas, inspirada na afirmação de Moreno de que “o eu é revelado pelo desempenho de papéis”. Importante para o autoconhecimento, a percepção dos comportamentos e a criação de novas atitudes.
Veja como as utilizei no desenvolvimento de Henrique:

Etapa Um: Role Talking ou Assumindo os Papéis
Na primeira reunião solicitei que Henrique, falasse sobre sua história profissional, detalhasse as conquistas em sua carreira, Henrique falou animadamente sobre sua trajetória por alguns minutos, tinha tido uma carreira de muitas conquistas e crescimento rápido, havia acabado de assumir a diretoria de uma nova área da organização e relatou ainda que pretendia fazer uma reunião com seus gestores para apresentar resultados e os próximos desafios. Neste momento Henrique preparou a sua reunião onde efetivamente atuaria como protagonista da sua própria história.

Etapa Dois: Role Playing ou Atuando no Papel
Como Henrique pretendia fazer mudanças acerca de seu comportamento, fui convidada a participar da reunião para observá-lo na atuação de seu papel.
No dia da reunião com a equipe, estava lá Henrique atuando em seu papel mais recente na companhia de sua nova equipe e eu acompanhando como expectadora. Observei que embora ele estivesse preparado para a reunião, tinha certa distância e frieza nas relações com a equipe, sua postura física dava um ar de arrogância e prepotência. Eu ganhava neste momento o desafio de mostrar à ele que havia realmente algo a mudar.
Voltando para as sessões de coaching apresentei as minhas percepções e utilizei a técnica do Espelho para exemplificar seu comportamento.

Técnica do Espelho:
Neste momento, espelhei o comportamento observado na reunião, fiz o papel de Diretor com a equipe e ele colocou-se no papel da equipe ouvindo o Diretor.
Pude apresentar a ele através da minha postura, atitudes e palavras ditas por ele, na reunião que assisti, e como estes comportamentos estavam afetando a equipe. Henrique ficou surpreso e reflexivo.
Neste momento houve um grande aprendizado, e ele sabia exatamente o reflexo de seu comportamento nas pessoas.

Etapa Quatro:
Role Creating ou Atuando Criativamente nos Papéis
Toda a discussão e análise que a utilização das metodologias do psicodrama proporcionou à Henrique contribuiu para que ele desenvolvesse novas formas de conduzir reuniões, alterar a postura e sintonizar-se com a equipe, foram vários ensaios até que Henrique pudesse efetivamente, agir de forma adequada e amigável com sua equipe.
Obviamente as mudanças não se deram do dia para a noite, e nem foram definitivas: os ajustes foram sendo aplicados à medida que se faziam necessários. Entretanto, o uso equilibrado de seus talentos conseguiu ajudá-lo a modificar o cenário em que atuava.
De maneira geral, É bastante curioso observar como o comportamento dos indivíduos atinge as pessoas com quem se relaciona. Jacob Levy Moreno, médico de origem judaica, criador do psicodrama tinha como visão a espontaneidade, a criatividade e a sensibilidade como recursos inatos ao homem. Dizia que desde cedo o homem traz consigo fatores favoráveis ao seu crescimento e desenvolvimento, que não vem acompanhado por tendências destrutivas, porém estas condições podem ser desenvolvidas por ambientes e sistemas sociais. O homem como agente participante da cena da vida social.
Segundo Moreno, ao nascer, o homem já traz consigo a espontaneidade, capacidade de responder e agir de forma adequada às situações. Pode deixar de sê-lo devido a fatores adversos ao meio ambiente. Estes obstáculos encontram-se no ambiente afetivo emocional com o grupo de pessoas mais próximo da criança (Matriz de Identidade e Átomo Social) bem como no sistema social em que a família convive (rede sociométrica e social).
A proposta de Moreno, é recuperar a espontaneidade e a criatividade que o homem tem ao nascer e perde com o convívio social. Para haver espontaneidade e criatividade, é necessário que nos reconheçamos como responsáveis de nosso próprio destino, estar presente nas situações e ter a capacidade de transformar as relações insatisfatórias por relações e situações novas e satisfatórias.
Henrique ao experimentar as metodologias da dramatização, pôde conhecer seus talentos, identificar as formas de atuação na vida social, os reflexos nas pessoas e criar novas formas de relacionar-se, estimulando a busca dos resultados da equipe utilizando seu talento de forma adequada sem tornar-se distante e arrogante.
Henrique passou por 15 sessões de coaching no total e ao longo do tempo solicitou alguns atendimentos específicos para metas e mudanças do cotidiano. Um ano depois assumiu uma nova diretoria na seguradora onde trabalha até hoje. Habituou-se a solicitar e fornecer feedbacks. Casou-se e teve dois filhos.
“ Participar dos encontros de coaching, trouxe pra mim a oportunidade de amadurecer como executivo e me desenvolver como gestor de pessoas. Henrique.”
Outras técnicas psicodramáticas utilizadas no processo de coaching do Henrique e que poderão ser utilizadas em atendimentos em grupos:
Justificativa: O psicodrama procura trabalhar as relações interpessoais a partir do tempo presente, Moreno opunha-se as teorias que investigavam o passado para desenvolvimento de relações atuais e futuras, por isso ser importante trazer o participante para o “Aqui e agora”.
AQUECIMENTO INESPECÍFICO: observar genuinamente os participantes para identificar o protagonista e trazê-lo para o momento presente.
Objetivo: fazer surgir no grupo o protagonista a ser desenvolvido naquela sessão ou identificar no indivíduo o tema ou a relação a ser trabalhada naquele encontro.
Como se aplica: solicitar que digam como estão se sentindo, como foi o dia, a semana e o que esperam trabalhar no dia de hoje. O Coch deve estar atento para a emergência que deverá aflorar no próprio grupo ou indivíduo pois o protagonista pode evitar (inconscientemente) de confrontar consigo mesmo. Observar como os participantes chegam a sessão de coaching, o ritmo respiratório, ritmo da fala, postura, expressões faciais propor algo que possa trazê-lo para o “Aqui e Agora” ou momento presente.

AQUECIMENTO ESPECÍFICO
após a identificação do protagonista, esta é a etapa de preparação para a dramatização, é a recuperação dos sentimentos e ações vividos na situação que deseja trabalhar.
Objetivo: gerar clima de confiança entre o coach, coachee e o grupo, para preparar-se com sentimentos e atos que possam ser dramatizados sobre as relações a serem trabalhadas.
Como se aplica: os participantes devem apoiar-se fisicamente umas nas outras e de mãos dadas entregando o peso do corpo em busca de equilíbrio.
Variação do exercício: o grupo forma uma roda com uma distância de um palmo entre um participante e outro. O protagonista escolhido no aquecimento inespecífico, posiciona-se no centro e joga o corpo para traz em busca de equilíbrio. O grupo deve segurá-lo para que ele não caia.
JOGO DAS CADEIRAS VAZIAS
Objetivo: Técnica focada na solução de problemas, pode ser utilizada para gerar o maior número de recursos na tomada de decisão ou solução de um dilema que pode estar impedindo o coachee de atingir sua meta ou caminhar para o cumprimento da meta. Contribui para o fortalecimento emocional do coachee na tomada de decisão.
Como aplicar: Organizar em uma sala, 6 cadeiras. Uma para o cochee e 5 cadeiras vazias.
Solicitar que ele imagine 5 pessoas que podem ajudá-lo a resolver este dilema. Podem ser personagens da TV, histórias em quadrinhos, pessoas conhecidas, símbolos ou figuras.
Explique ao cochee que farão um trabalho que ele vai usar a imaginação e vai entrar em contato com cada uma das pessoas indicadas. Solicite que ele sente na cadeira escolhida e dramatize cada um deles falando os conselhos que dariam para solucionar o dilema e o que eles fariam no seu lugar. O coach deverá anotar as respostas e as possíveis soluções em uma folha em branco.
Perguntar como se sentiu dramatizando cada um destes personagens e como se sente após ouvir os conselhos recebidos.

JOGO DOS 4 ARQUETIPOS – “THE 4 BEST” – (Guerreiro, Curador, Visionário, Mestre)
Objetivo: Técnica utilizada para fortalecer o coachee a enfrentar situações conflituosas no cotidiano.
Como aplicar: O Coach deve explicar os 4 arquétipos, Guerreiro, Curador, Visionário e Mestre e solicitar que o coachee imagine uma pessoa, um animal ou um objeto que represente cada um dos arquétipos.
Solicita que o cochee localize na sala, um ponto onde esteja metaforicamente a meta a ser atingida. Entrega na mão do Coachee quatro quadrados com a letra, foto ou imagem de cada arquétipo.
Confirme o seu conhecimento sobre a meta a ser atingida, solicite que o coachee caminhe pela sala em direção a meta. A cada dois ou três passos em direção a meta, peça que o coachee converse com cada mentor individualmente (Guerreiro, Curador, Visionário e Mestre) a respeito da conquista, conselhos e ações que eles fariam em seu lugar para atingir a meta. Anote em uma folha branca separando cada conselho e cada ação sugerida pelos mentores por fim pergunte ao coachee qual foi o melhor conselho e a melhor ação sugerida. Encerre a sessão solicitando que ele agradeça aos mentores a conversa que teve com cada um deles.
Estes são exercícios de espontaneidade e criatividade, advindos do psicodrama e que fortalece a teoria do coaching de que as pessoas possuem todas as respostas que precisam obter a cerca de determinadas situações. Aplico estes exercícios de acordo com a situação do coachee ou leitura do grupo.
“Cada ser humano é um enigma para si e para os outros, por conta da sua essência peculiar.
Nossas relações dependem, de nos aproximarmos deste enigma, não só com a razão, mas com o sentimento e a sensibilidade.
Aprofundar-se na complexidade da natureza humana, é poder ver cada indivíduo sob uma luz correta.”
Rudolf Steiner
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Camila Salles Gonçalves, José Roberto Wolff e Wilson Castello de Almeida, Lições de Psicodrama – Introdução ao Pensamento de J.L. Moreno – Agora, 1988.
Matos, Jorge e Vânia Portela, TALENTO Para a Vida , Human Learning , 2006.
Steiner, Rudolf, O Mistério dos Temperamentos – Ed. Antroposófica.


Ana Penarotti é formada em Pedagogia, pós-graduada em Gestão de Pessoas e Qualidade. É Psicodramatista, Consultora com foco na Antroposofia, Gestão Estratégica em Neurobusiness e Coaching Internacional. Cursa Pós em Transdisciplinaridade é Consultora “DISC”. É co-autora do livro PNL&Coaching. Sócia da Tríax Treinamento e Desenvolvimento Humano, e docente em escolas como SENAC e Sincor.

By | 2015-12-04T12:57:29-02:00 dezembro 4th, 2015|Artigos|Comentários desativados em Uso de Psicodrama nas sessões de Coaching

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